terça-feira, 29 de abril de 2008

O importante é não competir

O importante é não competir
Quer vencer seus competidores? O que você precisa não é derrotá-los. É torná-los irrelevantes
Marcelo Aguiar

Uma metáfora simples resume uma das poucas idéias verdadeiramente novas e de impacto no campo dos negócios. Os professores W. Chan Kim e Renée Maubourgne, da segunda maior escola de administração do mundo, a Insead, na França, compararam o mercado a um oceano. Quando a competição é feroz, o sangue corre e o mar fica vermelho. Mas, se uma empresa cria algo indiscutivelmente novo, ela passa a navegar sozinha em um mar sem competição - um oceano azul. Em 2005, Kim e Maubourgne fizeram furor com seu livro, A Estratégia do Oceano Azul, sobre como qualquer companhia pode fugir da competição e criar o próprio mercado. Ganharam críticas entusiasmadas e foram ao topo das listas especializadas de best-sellers. De lá para cá, Chan Kim navega no próprio oceano azul: virou estrela do mercado de palestras. E vem ao Brasil em novembro. De Paris, deu entrevista a ÉPOCA.

ÉPOCA - O segredo para criar novos mercados é a inovação? W. Chan Kim - Inovar é sempre bom, mas não garante o sucesso. O Iridium (telefone móvel por satélite) era uma inovação tecnológica, mas a Motorola perdeu milhões de dólares com ele. Outro exemplo foi a Philips com o CDI (o primeiro videogame multimídia). Foi um produto muito inovador, de alta tecnologia, mas um fracasso comercial. Inovação não é garantia de sucesso comercial.
ÉPOCA - O que transforma inovação em sucesso comercial? Chan Kim - É a grande pergunta hoje em dia. Que tipo de inovação perseguir? Qual abandonar? Como escolher uma idéia? Como administrá-la? Como ter certeza de que o modelo de negócios funcionará? Como administrar o risco? Isso é a estratégia do oceano azul. É o que produz o sucesso.
ÉPOCA - Os fracassos de Iridium e CDI poderiam ter sido evitados? Chan Kim - Poderiam ser previstos.
ÉPOCA - As empresas podem conscientemente criar novos mercados ou isso acontece por acidente? Chan Kim - Muitas fizeram isso por acidente. Outras, propositalmente. Existe gente brilhante que não foi à escola, mas que, quando faz negócios, ganha dinheiro. São pessoas que não seguiram fórmula alguma, mas que têm um modelo de pensar.
ÉPOCA - Como é esse modelo? Chan Kim - Produtos de sucesso ou diferenciam-se dos demais ou têm preço baixo. Mas quem cria um oceano azul alcança diferenciação e custo baixo ao mesmo tempo. Essa estratégia cria uma percepção alta de valor. O produto alcança um preço excepcional. É a soma de uma boa idéia e uma boa execução

ÉPOCA - Para chegar lá é preciso ter os melhores funcionários possíveis? Chan Kim - É claro que é melhor ter gênios, mas você pode ser uma pessoa brilhante que trabalha em uma organização estúpida. E você se sente estúpido. E pessoas estúpidas podem se sentir brilhantes quando trabalham em uma organização brilhante.
ÉPOCA - Então qualquer um pode ser criativo? Chan Kim - Criatividade pode ser de dois tipos: individual e coletiva. Criatividade individual é como Einstein, um gênio. Você não pode prever isso, essas pessoas nascem assim. Mas essa criatividade é difícil de administrar. A criatividade coletiva é muito diferente. As pessoas ficam motivadas, elas tentam pensar seu melhor, mudam sua comunicação.
ÉPOCA - O senhor diz que as empresas devem evitar a competição? Chan Kim - Não. Mas podem torná-la irrelevante. O problema é que, quando as pessoas falam de competição, pensam em benchmarking (comparação de uma empresa com os líderes do setor). Tentam imitá-los e fazer melhor. Isso é o oceano vermelho. É perigoso. O que nós dizemos é que, se você perseguir a diferenciação e o custo baixo ao mesmo tempo, sai da competição e torna-a irrelevante. Você estará nadando para fora do oceano vermelho do sangue da competição.
"O problema é que, quando as pessoas falam em competição, tentam imitar o líder e fazer melhor que ele. Isso é o oceano vermelho. Isso é perigoso''
ÉPOCA - Há exemplos? Chan Kim - A Starbucks competia com a indústria italiana de café. Todos os dias tentavam roubar participação de mercado um do outro. No meio disso, a Starbucks pensou: aonde as pessoas vão para beber um café? Só havia dois lugares (nos Estados Unidos). Um deles era em casa. E o outro era em um bar de hotel. Mas paga-se caro em um hotel. E você toma café lá por causa da atmosfera. Eles pensaram: podemos vender o lugar e o café. Então seus competidores se tornaram irrelevantes.
ÉPOCA - Mas a Starbucks tem concorrentes hoje. Chan Kim - A Starbucks criou um monopólio por algum tempo - 15, talvez 20 anos. Agora há imitações, o oceano ficou vermelho. E daí eles precisam pensar no azul de novo. Eles se perguntaram: o que as pessoas fazem enquanto tomam café? Talvez elas possam comprar música. Essa estratégia não é para ser usada uma vez. É uma atitude contínua.
ÉPOCA - Alguma empresa acertou duas vezes? Chan Kim - Um bom exemplo é a EMC, dos complexos de cinemas Multiplex. Eles ganharam muito dinheiro e foram imitados. Então criaram o Megaplex. É como um estádio com uma grande tela. Com o entretenimento digital doméstico e as TVs de tela grande, as pessoas ficam em casa. Por que ir a um cinema, pagar por isso e assistir a um filme cheio de barulho? O Megaplex é um passeio da família. Quando você assiste a um filme como Ben-Hur, não esquece aquela tela gigante. Ao mesmo tempo tem um restaurante, um lugar para visitar. A EMC criou um novo oceano azul.
ÉPOCA - Quem não soube se renovar? Chan Kim - O exemplo é a Body Shop. Quando surgiu, eles pensaram: mulheres feias não podem ser bonitas. Então eles propuseram preservar a pele com ingredientes naturais. Diferenciaram-se de todas as promessas de outros cosméticos, e com custo baixo. Ficaram nadando em um oceano azul por dez a 20 anos. Depois, a imitação veio, mas, se eles não entendem por que atingiram o sucesso, não conseguem repeti-lo. Intuição genial é importante. Mas só ela não resolve, porque você não pode escrever a fórmula. Se você quer que gente comum seja criativa, precisa da fórmula.
ÉPOCA - Esse é o único caminho para o sucesso de um negócio? Chan Kim - Não. Existem muitos caminhos para o sucesso, como as fusões e aquisições. Há outros caminhos, certamente. Mas como você pode produzir gênios? A gente sabe que esse é um caminho para o sucesso, mas a gente não viu o modelo.
ÉPOCA - O velho caminho da competição ainda funciona? Chan Kim - Você pode ser um cara esperto na competição com outros. Nós não estamos negando as estratégias do oceano vermelho. As empresas competem e fazem muito dinheiro assim. Mas já sabemos muito sobre isso. E decidimos escrever sobre algo que ninguém sabia.

fonte:http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR75025-6012,00.html

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