Autores: W. Chan Kim & Rennée Mauborgne Como fazer a concorrência tornar-se irrelevante Por Stela Campos. Publicado originalmente no jornal Valor Econômico, em março de 2005. O consultor Francis Gouillart traz ao país os princípios da inovação de valor, tese criada no Insead. Se basearem sua busca pelo lucro apenas em uma briga sanguinária com a concorrência, as empresas nunca conseguirão chegar ao oceano azul, um espaço inexplorado do mercado onde existe um grande potencial de crescimento. Estes são alguns dos princípios utilizados no conceito de inovação de valor, criado pelos professores do Insead, W. Chan Kim e Rennée Mauborgne, autores do livro A estratégia do oceano azul (editora Campus) e que está sendo difundido pelo mundo pelo consultor Francis Gouillart, presidente da consultoria americana Value Innovation Partnership. Gouillart esteve no Brasil este mês para divulgar os caminhos da inovação de valor aos executivos brasileiros em vários workshops, promovidos pela Symnetics em São Paulo e no Rio. A teoria defendida por Gouillart prevê que a combinação de custos reduzidos e produtos diferenciados tornam a preocupação com a concorrência irrelevante. Ele acredita que mesmo em setores que não estão crescendo é possível encontrar um oceano azul através da reorganização e inovação nos processos de gerenciamento. Na sua opinião, as companhias precisam racionalizar suas estratégias e serem maleáveis para oferecer exatamente o que o cliente quer. Foi isso que fez o Cirque Du Soleil ao eliminar os animais de suas apresentações, que só agregavam custo à empresa e não representavam um diferencial para o público. No Brasil, outros exemplos de aplicação da inovação de valor são a Gol linhas aéreas e os Hotéis Fórmula, da rede Accord. Em sua passagem pelo país, Gouillart falou com exclusividade ao Valor. Eis alguns trechos da entrevista: Valor: O que significa o conceito de inovação de valor? Francis Gouillart: É ter uma estratégia vencedora que prevê a redução do custo de produção e o aumento do valor do seu produto. É um paradoxo à estratégia apresentada ao mundo por Michael Porter, onde você deve fazer uma coisa ou outra. Ele acredita que ou você reduz os custos de um produto ou procura diferenciá-lo. Já o conceito de inovação de valor diz que a maioria das estratégias vencedoras são uma combinação das duas coisas. Historicamente, Porter diz que você não pode ser nada no meio, porque ficará parado. Existem ótimos fabricantes que têm custos baixos e são diferenciados na mente do consumidor. Em muitas indústrias você vai achar isso. A essência da inovação de valor diz que você tem que estar nesse meio termo. Michael Porter é economista e olha para a indústria em termos estruturais, quer sabre qual a sua lucratividade. Só que muitos inovadores tem que operar em indústrias que não têm um grande crescimento, por isso, precisam redesenhar a sua organização e imagem. Eles mudam pelos dois lados. Valor: Quando se redesenha uma organização, o que é preciso fazer para que as pessoas dela se comprometam com essa transformação? Francis Gouillart: O jeito mais fácil de implementar essa transformação é quando o top management quer fazer isso e está comprometido o suficiente para mudar as regras e a cultura da companhia. Isso torna tudo mais fácil. A Apple é exemplo recente disso. A companhia historicamente sempre foi inovadora e muito focada na interface com o cliente. Quando ela surgiu poucas empresas no universo da indústria de computadores tinham esse foco. Steve Jobbs nesse caso tinha um ideal e o levou adiante. Outros casos de processos de inovação de valor envolvem uma aproximação piloto, feita de um modo mais subversivo. Um grupo em particular tem interesse em modelar esta aproximação. A transformação personalizada de inovação de valor acontece em uma escala modesta. Se você personaliza essas relações percebe que pode competir de uma forma diferenciada e que o custo de produção é menor que o custo de comprar grandes tecnologias. As pessoas naturalmente respondem por isso. E o sucesso vem com essa modernização. Valor: Isso quer dizer que um processo de inovação pode começar de uma forma modesta em um departamento e depois se espalhar por toda a organização? Francis Gouillart: Exato. É mais difícil fazer desta forma, obviamente, mas é uma solução que funciona. Ela é baseada em talentos e é a melhor saída se você não tem o comprometimento da liderança. Valor: O Sr. acredita que é uma questão de boa comunicação, de comprometer emocionalmente seus funcionários? Isso chega até os clientes? Francis Gouillart: O coração do processo de inovação de valor é o oceano azul que existe, tradicionalmente, entre você e seu consumidor. Na teoria, a comunicação não toca o seu cliente efetivamente. Mas na prática, esse tipo de relacionamento pode ser muito mais maduro. O bom relacionamento é multifuncional. É quando você tem o pessoal do design dialogando com o pessoal do design do cliente. O pessoal de logística fazendo a mesma coisa. Eles começam a pensar em uma cadeia integrada. O pessoal técnico interage com as pessoas do outro lado. Num bom relacionamento, você tem muitos pontos de contato nos dois lados dialogando. Em muitas indústrias você tem apenas um tipo de relacionamento restrito e limitado. Ele basicamente conecta os extremos. O cara que vende com o que compra. Se você observar uma rede de fornecedores automotivos, por exemplo, eles eliminam qualquer tipo de diálogo técnico e apenas competem por preço. Toda a cadeia é pressionada pelas montadoras lá no topo. Normalmente, uma das companhias americanas força todos da cadeia a cortar custos e este se torna o pior de todos os tempos. Isso porque tudo que você vê é uma agregação de valor barata de componentes que flutuavam juntos. Se você contrastar isso com o modelo usado pelos japoneses verá que ele é muito diferente. Na visão deles, o carro é resultado de uma cooperação técnica de engenharia e manufatura. Se você for um fornecedor de peças ou de varejo irá querer trabalhar com os japoneses. A inovação de valor requer um diálogo mais rico em toda a cadeia. Valor: O que esse processo tem em comum com a reengenharia? Francis Gouillart: A teoria é diferente. A aproximação básica da reengenharia é fundir o que a companhia faz e o que as pessoas querem no fim do processo. Você valoriza o que elas querem. Por exemplo, se você redesenhar seu processo de entrega, você irá perguntar o que o seu cliente quer. Vamos dizer que ele queira que o custo caia, que o material chegue rápido e tenha qualidade. Isto é o que a maioria das pessoas quer no fim do processo. A inovação de valor é mais que isso, mais que um processo, é um diálogo. A companhia importa, o cliente importa, não interessa quem seja o consumidor: uma outra indústria ou um negócio business to business. Não é guiar para uma determinada direção como faz a reengenharia tentando adivinhar o que deve ser providenciado. A inovação de valor é basicamente ir pelos dois caminhos, ouvir todos. De fato, eu não posso fazer todo tempo exatamente a mesma coisa porque a pessoa do outro lado terá cada vez um ponto de vista diferente. Na prática, você tem que dialogar com o consumidor, porque cada vez o cliente virá com uma expectativa diferente e você terá que atende-la. Valor: Nesse período no Brasil, o Sr. observou se os executivos brasileiros parecem dispostos a aplicar esse conceito? Francis Gouillart: Aqui existe um ambiente de crescimento. Os setores químico e de concreto na Europa e nos Estados Unidos, por exemplo, não têm muito o que crescer. Já no Brasil existem muitas coisas acontecendo. As pessoas que trabalham nas companhias aqui têm que saber o que farão, no futuro, lá na frente. Elas ainda estão se preparando para uma demanda crescente e a inovação de valor será necessária quando as indústrias começarem a se estabilizar ou quando outros países emergentes começaram a desafiá-las. Eu acredito que os executivos brasileiros têm a mente suficientemente aberta para fazer isso.
Fonte: Valor Econômico.
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